terça-feira, 7 de abril de 2009

Filme “O terminal” - Relações entre aspectos sociais, antropológicos e existênciais presentes

O filme “O terminal” é uma pequena obra – prima . Sei que alguns (muitos?) terão visto na narrativa apenas uma história boba sobre alguém retido num aeroporto.

As mesmas pessoas que viram no filme uma narrativa superficial sobre alguém retido num aeroporto seriam as pessoas que achariam que “Matrix” é apenas um filme de ficção científica ou para ir mais longe que o “esperando Godot” de Samuel Beckett é uma narrativa idiota sobre dois sujeitos esperando um terceiro. Ou ainda que “o deserto dos tártaros” de Dino Buzzati é apenas um romance enfadonho sobre a vida num quartel de fronteira. Estas pessoas seriam casos irremediáveis de incapacidade imaginativa , de analfabetismo das entrelinhas , de não ver nada além das aparências.

Escreveu o grande Geraldo Vandré que “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. Porém , cada vez mais, somos forçados a “esperar acontecer” porque o “fazer a hora” saiu de nossas mãos.

O ser humano pode ser comparado a alguém retido num incomensuravelmente grande aeroporto onde esperamos que a nossa vida seja resolvida por poderes dos quais não temos sequer a idéia. Muitos (como o personagem interpretado por Tom Hanks no filme) não aceitam passivamente esta condição e lutam por um objetivo num mundo estranho onde não somos compreendidos , ou melhor , onde o somos de maneira incompleta e errônea. Entretanto, para avançar mais com o paralelo, estamos esperando um desfecho na interminável espera que constitui nossas vidas .

Embora “O terminal” se passe na Nova York supostamente contemporânea, as referências temporais são inexistentes (em que ano se passa a história?) a não ser no contexto do personagem principal que teria ficado 9 meses no terminal aeroportuário. Isto nos remete à outras histórias ficcionais que se desenvolvem em “ não lugares” tais como “o ensaio sobre a cegueira” de José Saramago ou os já citados “ Em attendant Godot “ (esperando Godot) de Samuel Beckett e “O deserto dos tártaros”. Sobre estas duas obras pode-se dizer que são paradigmáticas no que tange aos “não-lugares” . Nenhuma das duas possuí qualquer indicação espacial ou temporal. Nada liga os personagens ao “lugar” da trama (pelo contrário, em ambas as histórias os personagens ali se encontram a contragosto – tal como em “O terminal”).

Enfim no filme nota-se um diretor (Steven Spielberg) que ousou fazer algo com temática mais adulta ao contrário de “blockbusters” como “Tubarão” e o “O resgate do soldado Ryan”. O principal deste filme maravilhoso se encontra nas entrelinhas onde há muito a ser lido. É para ver e pensar (muito).


Marise von Frühauf Hublard




Um comentário:

  1. Oi, Marise!

    Adorei tua análise do filme!!!
    Ontem à tarde falávamos sobre esse filme e sobre "O náufrago" em sala de aula... fazendo um contraponto ao nosso imobilismo frente a muitas adversidades...
    Nem de perto com a profundidade e clareza que expressas neste texto!!!
    Mas uma boa coincidência!!!!

    Abraços!

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